Ajudar os seus pacientes a superarem a compulsão alimentar pode ser complexo e exige a atuação em conjunto com outros profissionais de saúde. Aqui você encontra como pode ajudar os seus pacientes a reduzirem os episódios de compulsão e a melhorarem sua saúde e qualidade de vida.

A compulsão alimentar é um dos transtornos alimentares (TA) mais comuns, e que precisa de um tratamento cuidadoso para garantir a recuperação completa do paciente. Considerando que este transtorno está intimamente relacionado com a ingestão de nutrientes e com o consumo alimentar, os nutricionistas possuem um papel importante no tratamento e processo de recuperação. Você pode fazer isso ajudando seus pacientes a reconhecerem a diferença entre os sinais de fome e saciedade, a melhorarem sua relação com a comida, e através da prática da atenção plena ao comer (mindful eating).

Antes de discutirmos algumas recomendações para ajudar o seu paciente a reduzir os episódios de compulsão, vamos entender o que é o transtorno de compulsão alimentar e o que pode contribuir para a sua ocorrência.

Compulsão alimentar e exagero alimentar

O termo compulsão alimentar pode, muitas vezes, ser confundido com os episódios de exagero alimentar, e por isso, como nutricionista é importante que você entenda a diferença entre os dois para aconselhar os seus pacientes.

Comer em excesso é tipicamente caracterizado como comer eventualmente mais do que planejado ou sentir-se muito cheio após uma refeição; o que não é considerado um transtorno alimentar.

Por outro lado, o transtorno de compulsão alimentar é um TA marcado por episódios recorrentes de consumo de alimentos em uma quantidade maior do que a normal em um curto espaço de tempo. Estes episódios ocorrem, em média, pelo menos uma vez por semana durante três meses, podendo ser consumidas de 5.000 a 15.000 calorias de uma só vez.

Os pacientes têm sintomas similares daqueles diagnosticados com bulimia nervosa, no entanto, eles não restringem a alimentação ou recorrem a métodos purgativos para compensar os episódios de compulsão. Os critérios diagnósticos e sintomas mais comuns incluem:

  • Ingestão, em um período limitado de tempo, de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, mesmo sem fome;
  • Sentimentos de vergonha, repulsa por si mesmo, e culpa após comer excessivamente;
  • Comer muito mais rápido do que o normal;
  • Comer até sentir-se incomodamente repleto;
  • Comer sozinho por vergonha devido à quantidade de alimentos que consome;
  • Não ter comportamentos compensatórios, como vômitos, uso de laxativos e prática de atividade física excessiva.

O consumo alimentar aumentado pode levar ao sobrepeso ou obesidade, que aumentam o risco para doenças crônicas e cardiovasculares.

O que pode contribuir para o exagero ou compulsão alimentar?

O transtorno de compulsão alimentar é multifatorial, e quer seja psicológico, social ou físico, existem muitos fatores que podem levar tanto ao consumo alimentar exagerado quanto ao transtorno de compulsão alimentar. Abaixo são descritos alguns dos que podem culminar no exagero alimentar ou no deselvolvimento do transtorno de compulsão alimentar:

Fatores físicos

Os exageros alimentares podem ocorrer quando o corpo não atende às suas necessidades fisiológicas. Isto inclui:

  • Baixíssimo consumo calórico
  • Dieta com privação alimentar severa
  • Limitação drástica do consumo de carboidratos
  • Excesso de exercício físico
  • Desidratação
  • Substituição de refeições por líquidos
  • Evitação de um alimento por achar que ele é "ruim"
  • Estar abaixo do peso
  • Utilização de métodos purgativos, como laxantes

Fatores emocionais

Os exageros alimentares e a compulão alimentar também podem ser desencadeados por emoções, como, por exemplo:

  • Raiva
  • Tédio
  • Estresse
  • Ansiedade
  • Inadequação
  • Tristeza
  • Solidão
  • Baixa autoestima
  • Vergonha

Superar a compulsão alimentar com a avaliação nutricional adequada

Ao trabalhar no tratamento do transtorno de compulsão alimentar ou mesmo na melhora dos episódios de exagero alimentar, é recomendado que você entenda profundamente como é a relação do seu paciente com a comida e com as escolhas de estilo de vida, e que também pergunte sobre outros transtornos psiquiátricos coexistentes (como depressão, ansiedade e TOC). Você pode incluir algumas perguntas na sua avaliação, como por exemplo:

  • Quando você quer comer, o que você tem vontade de comer?
  • Comida ou não, o que lhe satisfaz e traz alegria?
  • Quando você come, você realmente tem fome?
  • Como você se sente neste momento?
  • Como você pode se confortar sem a comida?
  • Quais são as atividades e hobbies que você pratica que não estão relacionados à comida?
  • Você sente que falta algo na sua vida?

Recomendações alimentares e de estilo de vida para superar a compulsão alimentar

Dependendo da gravidade da condição do seu paciente, ele pode exigir diferentes níveis de atendimento e tratamento, como o tratamento hospitalar ou internação. Contudo, se o paciente estiver suficientemente estável para trabalhar com você em um ambiente ambulatorial, aqui estão algumas recomendações para ajudá-lo no tratamento da compulsão alimentar.

1. Praticar o 'mindful eating'

Você pode ajudar os seus pacientes a aprenderem a ouvir seu corpo, levando em consideração o que sentem no momento presente, especialmente enquanto comem. Isto pode ajudar a evitar o comer exagerado, e no reconhecimento dos sinais de fome e saciedade; além disso, comer com atenção plena pode auxiliar na melhora dos comportamentos alimentares e parece reduzir a incidência da compulsão alimentar.

2. Incentivar o consumo de alimentos nutritivos

Embora você deva incentivar seus pacientes a apreciarem todos os alimentos, você pode recomendar escolhas nutritivas e que promovem a saciedade. Alguns estudos demonstraram que dietas ricas em proteínasgorduras saudáveis, e fibras podem melhorar a saciedade. Isto pode diminuir o desejo de "beliscar" e cometer exageros alimentares ao longo o dia.

3. Entender que a comida é sua amiga

Um estudo referiu que pessoas que relataram consumir com maior frequência refeições prontas ou de fast food tiveram menor controle sobre o desejo de comer.

Pessoas com transtornos alimentares geralmente têm muitos pensamentos negativos sobre os alimentos. Então, como nutricionista, uma das suas funções é ajudar seus pacientes a mudarem as crenças negativas para passarem a enxergar os alimentos como uma fonte de nutrição e prazer, assim como ajudá-los a compreender os sinais de fome e saciedade.

Como muitas pessoas com transtornos alimentares sentem culpa ou vergonha ao consumir certos alimentos, você pode ajudar seus pacientes a entenderem que a comida proporciona sustento e prazer, incentivando o pensamento de que "toda alimento é bom". À medida que as consultas progredirem, você também pode ajudar seu paciente a ficar mais confortável com atividades relacionadas à comida (tais como cozinhar, fazer compras ou comer fora).

4. Mudar o estilo de vida

Alguns estudos referem que o sono adequado, a prática de atividade física não compensatória, e a hidratação desempenham um papel na redução de comportamentos alimentares irregulares. A satisfação dessas necessidades pode auxiliar na melhora da imagem corporal e pode diminuir a sensação de fome do seu paciente. Além disso, você pode incentivar o seu paciente a buscar ajuda na sua rede de apoio, com amigos, familiares, ou outras pessoas que cumpram esse papel, uma vez que ter alguém com quem conversar pode ajudar o seu paciente no tratamento.

5. Não pular refeições

Quando o seu paciente adere a um padrão alimentar regular, ele pode reduzir o risco do comer excessivo. Alguns estudos referem que uma maior adesão a um padrão alimentar regular (3 refeições e de 2 a 3 lanches planejados por dia) está associado a uma menor frequência de episódios de compulsão durante a semana. Além disso, pular refeições pode alterar o equilíbrio entre a ingestão alimentar e a produção de insulina, o que pode causar alterações nos níveis de açúcar no sangue.

Curiosamente, problemas na secreção de grelina e leptina, e na sensibilidade à insulina parecem estar envolvidos na patogênese dos transtornos alimentares.

6. Trabalhar em conjunto com outros profissionais de saúde

Dependendo da gravidade do transtorno alimentar do seu paciente, ele pode exigir diferentes níveis de atendimento e tratamento, como o hospitalar, residencial, internação ou acompanhamento ambulatorial.

Como nutricionista, você trabalhará em conjunto com outros profissionais de saúde para garantir que as necessidades do seu paciente sejam atendidas. Essas necessidades podem variar entre cuidados constantes 24 horas por dia, consultas de algumas horas todos os dias ou até consultas apenas uma vez por semana.

Resumo

O transtorno de compulsão alimentar é complexo é pode afetar as pessoas de forma diferente. Os nutricionistas possuem um papel importante na recuperação dos pacientes e na melhora do seu relacionamento com a comida, nos ajustes dos padrões alimentares, e no trabalho conjunto com outros profissionais de saúde. Dessa forma, você tem um papel vital no processo de recuperação dos seus pacientes, ajudando-os a superarem a compulsão alimentar e a melhorarem a saúde e qualidade de vida.


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