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Nutricionista · 5695N

Nutrição Funcional: "Mais anos de vida, mais vida nos anos”

A mentira da fruta saudável: quando comer fruta faz mais mal do que bem

terça-feira, 15 de abril de 2025

Vivemos numa era em que é possível consumir morangos em dezembro, mangas em fevereiro ou melancia durante todo o ano. A globalização e a agricultura intensiva trouxeram uma grande variedade de alimentos às prateleiras. No entanto, será que o organismo humano está preparado para isso?

Neste artigo, explico por que razão o consumo de frutas fora da estação — ou que não crescem sob a mesma luz solar do local onde vivemos — pode interferir negativamente com o metabolismo, o ritmo circadiano e a saúde mitocondrial.


Fig1. Imagem criada por IA

Os alimentos e a luz são informação biológica

Ao longo da evolução, os seres humanos alimentaram-se do que a natureza oferecia em cada estação e em cada região. As frutas, por exemplo, estavam naturalmente disponíveis nos meses de maior luz solar, como o verão, e forneciam ao corpo energia rápida e antioxidantes em resposta à radiação solar e ao aumento da temperatura.

Hoje, o acesso a frutas tropicais ou exóticas em qualquer época do ano quebra esta sincronia natural entre o ambiente e o metabolismo. O corpo continua a funcionar com base em mecanismos biológicos antigos, desenhados para interpretar o ambiente através da luz, da temperatura e do tipo de alimentos disponíveis.

A fruta reflete o ambiente onde cresce

A composição nutricional da fruta — os seus antioxidantes, fitoquímicos, água, e até os açúcares — é moldada pela radiação solar, pela temperatura, pela humidade e pelo solo. Uma fruta tropical amadurecida sob forte radiação UV e elevada temperatura transporta uma “informação” que faz sentido apenas em climas tropicais.

Quando se consome esse tipo de fruta num ambiente frio e com pouca luz solar, como o inverno em Portugal, está-se a enviar ao organismo um sinal de verão e abundância, em completo desalinhamento com a realidade ambiental. Este desequilíbrio pode interferir com:

• O ritmo circadiano

• A produção de hormonas como a insulina, o cortisol e a melatonina

• A forma como o corpo gere a energia, armazena gordura e regula o apetite

O ritmo circadiano e o impacto dos alimentos

O corpo humano possui um “relógio biológico” — o ritmo circadiano — que regula funções como o sono, a digestão, a produção hormonal e o metabolismo energético. Este ritmo é altamente influenciado pela exposição à luz solar e pelo timing alimentar.

Consumir fruta rica em frutose num período do ano com pouca luz:

• Pode atrasar ou reduzir a produção de melatonina (essencial para o sono e a regeneração celular)

• Estimular a produção de insulina em momentos inadequados

• Promover a acumulação de gordura corporal, por ativar vias metabólicas próprias de períodos de “preparação para o inverno”

Frutose: natural, mas não neutra

Embora a frutose da fruta seja natural, o seu efeito metabólico depende do contexto em que é ingerida. Em excesso ou fora de época, pode:

• Aumentar a resistência à leptina, dificultando a sensação de saciedade

• Estimular a lipogénese hepática (produção de gordura no fígado)

• Elevar os triglicéridos sanguíneos

Sobrecarregar as mitocôndrias, dificultando a produção eficiente de energia

Aumentar a produção de ácido úrico, promovendo stress oxidativo e desregulação metabólica

Estes efeitos são compensados no verão, quando há mais luz solar, maior produção de vitamina D e geralmente mais atividade física. No inverno, a ausência desses fatores torna o consumo de frutose mais prejudicial.

Frutas importadas: luz e solo diferentes, nutrientes diferentes

Outro aspeto importante prende-se com a origem geográfica das frutas. Uma papaia do Brasil ou uma manga do México crescem sob condições ambientais muito diferentes das que existem em Portugal. A radiação solar, a latitude, o tipo de solo e a estação do ano influenciam os compostos bioativos presentes nas frutas.

Consumir uma fruta que não cresceu sob o mesmo tipo de luz solar que a pessoa recebe diariamente pode introduzir informação desajustada ao metabolismo, como se se estivesse a alterar o “calendário interno” do corpo.

Grande parte das frutas disponíveis fora de época são colhidas ainda verdes, transportadas milhares de quilómetros e amadurecidas com gás etileno, sem qualquer exposição à luz solar real. Isso reduz:

• A densidade nutricional

• A quantidade de fitoquímicos protetores

• A sua capacidade antioxidante natural

Além disso, muitas são cultivadas em estufas com luz artificial, solo empobrecido e condições controladas que não replicam o ambiente natural. Esse processo pode alterar o perfil fitoquímico e reduzir a sua vitalidade biológica.

Por fim, estas práticas podem ainda aumentar a presença de compostos vegetais defensivos, como lectinas ou oxalatos, que em algumas pessoas causam desconforto gastrointestinal ou inflamação.

O que se pode fazer na prática?

Dar preferência a frutas da estação e de produção local. A natureza sabe o que oferece em cada momento.

Evitar frutas tropicais durante o inverno, priorizando vegetais da época, alimentos ricos em gorduras boas e proteínas de alta densidade nutricional.

• Respeitar o ritmo natural do ambiente — tanto em termos de alimentação como de exposição à luz solar e descanso noturno.

Ajustar os hidratos de carbono à luz solar disponível, e não à vontade emocional: mais UV, mais tolerância; menos luz, mais necessidade de gordura e cetose fisiológica (um estado natural em que o corpo usa gordura como fonte de energia).


Lembrar: o metabolismo é regulado pela luz antes de ser regulado pela comida. Comer fora da estação é um erro de sinal — o corpo não tem como interpretar corretamente o que está a entrar.

Conclusão

O corpo humano está intimamente ligado aos ritmos da natureza. Comer conforme a estação e o ambiente local é uma forma poderosa de respeitar os próprios mecanismos biológicos, proteger a função mitocondrial, equilibrar o metabolismo e preservar a saúde a longo prazo.

A fruta fora da estação não é, por si só, um veneno — mas fora do seu contexto natural, deixa de ser o “alimento funcional” que poderia ser, e passa a ser um fator de desequilíbrio.

Referências científicas:

• Panda, S. et al. (2002). Circadian regulation of gene expression in mammals

• Johnston, J. D., et al. (2016). Circadian rhythms, metabolism, and chrononutrition in humans

• Lustig, R. H. (2012). The toxic truth about sugar. Nature

• Boros, L. G. et al. (2019). Deuterium depletion and mitochondrial NADPH production

• Lichtenthaler, H. K. (2007). Chlorophylls and carotenoids: pigments of photosynthetic membranes

Atinja os seus objetivos com o melhor acompanhamento!
Pedro Bizarro
Pedro Bizarro
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